Voto eletrônico tem futuro?


O Brasil é um dos países pioneiros na ampla utilização de urnas eletrônicas para todos os níveis de eleição, o que permite uma rápida apuração dos votos e remove o fator humano nesta, mas ao mesmo tempo, dada a inevitável existência de vulnerabilidades nas urnas e carência de mecanismos para auditoria dos votos, temos um risco de fraude que pode deslegitimar os resultados de uma eleição. Outro item importante em uma eleição de voto secreto é a manutenção do sigilo, evitando que se possa descobrir quem votou em quem.

Eu, bocudo do jeito que sou, me envolvi em discussões no Twitter contrário à proposição de uma reversão completa ao voto em cédulas de papel. Pois considero que não oferece proteção suficiente à supressão de votos e fraude, porém, podem ser confeccionadas para acelerar a apuração. Abaixo, uma interação que tive com Diego Aranha, professor e pesquisador, e um conhecedor dos problemas das urnas eletrônicas. Meu tweet foi em resposta a uma afirmação de que Blockchains não poderiam ser utilizadas para ampliar a segurança do voto preservando o sigilo do eleitor.





De forma bem simplificada, eu separei o processo de voto em duas etapas, e portanto, não me interessa se o meio de transmissão do voto mantém o sigilo ou não, pois ele já é anônimo, e a segurança contra fraude é provida pelo meio de transmissão, nesse caso a Blockchain.

Um exemplo de como poderia funcionar. Criamos uma criptomoeda, porém com o volume de moedas controlado e já "mineradas", sendo esse número equivalente ao número de eleitores registrados (algumas adicionais podem ser mineradas como recurso emergencial). O mecanismo de validação das transações pode ser o PoW (Proof Of Work, como no Bitcoin), mas acho que isso faz com que as transações tenham um alto tempo para serem processadas e gera um desperdício de energia. Existem alternativas que poderiam ser estudadas para atacar este ponto, mas não é um forte entrave. As moedas pré-mineradas, seriam por sua vez colocadas em carteiras, uma por carteira. Uma carteira nada mais é do que o par de chaves assimétricas, a pública que identifica a carteira e a privada que autoriza a transação, estas seriam impressas em QR code ou algo similar, preferencialmente barato.

No dia da eleição, o eleitor se dirige ao local de votação, apresenta os documentos aos mesários, e uma vez autorizado, uma das carteiras impressas lhe é concedida aleatóriamente. Ele se dirige a máquina de votação (que pode ser a coisa mais simples e barata possível, mas exige conectividade, ou talvez algum mecanismo de side-chain possa ser utilizado para áreas com ausência de conexão) e uma vez que esteja pronto para confirmar seu voto, ele escaneia os códigos e a moeda será transacionada para a carteira destino. As carteiras destinos são os candidatos participando da eleição e seus endereços (chave pública) estão armazenados na urna, a chave privada destas carteiras, por segurança podem ser destruídas, para que nenhuma transação de saída possa ser autorizada.

Como em outras Blockchains, esta também é pública e visível por qualquer um que participe do protocolo. Ou seja, apuração em tempo real! Isso se deve ao fato de que basta acompanhar as transações que estão ocorrendo e o saldo de cada candidato é o número de votos recebido.

Finalmente, gostaria de apontar que o "dia da eleição" não precisa mais ser um dia, e não precisa que o voto seja feito em um "local de votação". A mesma abordagem pode ser adaptada para que o eleitor possa ir em um centro de distribuição de votos, pegar o "voto" dele (basicamente a carteira que contém uma moeda, ou o tal do par de chaves). Uma vez com o voto dele, ele no conforto do seu lar, na hora que bem entender, abre o computador e lança o voto dele. Inclusive, na forma original como nesta adaptação, o eleitor pode descartar seu voto, caso nenhum candidato seja do seu interesse.

Foto no topo extraída de: https://fotos.jornaldacidadeonline.com.br/uploads/fotos/1509319885_160126296.jpeg
 

Comentários

AndreVC disse…
Salve meu caro. Quanto a "apuração em tempo real " e "lançar o voto quando quiser " como vc garante que o resultado parcial não influencie a votação ? Acredito que hj só após o Acre votar iniciam a divulgação. Outro possível problema seria o voto de cabresto : se ele pode votar em casa ele pode ser induzido a fazê-lo em frente a alguém? Abraço !
Julio Raffaine disse…
Oba, comentário! Vou responder as avessas, com relação à votar em casa, não é minha proposição original, seria algo mais como uma possibilidade caso fosse do interesse da população (por falar nisso, nos EUA você recebe o ballot em casa pelo correio e vota quando quiser). Concordo que no Brasil isso não seria uma prática saudável, pois a sessão provê uma janela de anonimato que o eleitor pode usar para "quebrar o cabresto", o que seria difícil de garantir caso ele votasse em sua casa.


Com relação a apuração em tempo real, eu realmente não havia pensado no fato de que pode haver uma influência da divulgação dos resultados naqueles que não votaram ainda, bom ponto. Vejo como alternativa tornar o protocolo "fechado", não no sentido de código, mas no sentido de que os nós de validação das transações na blockchain seriam controlados, e portanto só eles saberiam do resultado parcial.