Não esconda sua gordofobia


Razões diversas estarão por trás da silhueta de uma pessoa, pode ser a estética de um particular momento histórico, pode ser que essa mesma estética seja derivada de um contexto sócio-econômico, e que até mesmo possa estar registrado geneticamente não só em nós, mas em nossa flora intestinal, no conjunto de micro-organismos que habitam nosso sistema digestivo. Este último é o que creio ser mais recente, imagine que dentro de você existe uma micro-ecologia, onde você é o meio ambiente, existe uma conexão entre seu cérebro e sinais emitidos por esses organismos, que se não criam ações conscientes, criam vontades e desejos inconscientes (moods and cravings) [1][2]. A dieta dos indivíduos é a principal "pressão seletiva" da seleção natural no processo evolutivo desse micro-ecossistema, então por exemplo, certos organismos preferem abundância de certos alimentos e rejeitam outros, ao longo dos dias, os organismos sobreviverão baseado na dieta, mas ao mesmo tempo eles enviam sinais ao cérebro, criando demanda por uma dieta particular. A dieta, porém, não é a única pressão aqui, a genética do indivíduo impacta bastante e este tende a ser um fator difícil de medir e compreender, mas seria basicamente a forma que nossos corpos evoluíram para construir uma flora intestinal inicial [3]. Agora imagine que a dieta de um indivíduo é afetada não só pelo que demanda mas pela oferta que existe a disposição, e que sua situação sócio-econômica também é hereditária, vemos que pode haver uma convergência de um micro-bioma desfavorável com a abundância de alimento para estes organismos, que por vez resultará em um alto volume de sinais enviados ao indivíduo além da já negativa pressão sócio-econômica.

Nota-se que, portanto, não é uma simples questão de escolha individual sobre a dieta de um indivíduo e seus dependentes, mas sim algo fortemente influenciado por seu passado e sua atual situação sócio-econômica. Não quero com esse post ditar como as pessoas devem reagir ao que é considerado acima do peso ou mesmo obesidade, mas criar um contraponto à narrativa da escolha individual tão louvada nos dias de hoje, a narrativa dos seres racionais, de decisões racionais e que são frutos de um livre arbítrio seja este de origem divina ou natural. Quando o zoom está alto e observo de dentro de minha experiência subjetiva, sim, me parece que tudo que faço é uma decisão livre e consciente, uma decisão minha ao menos. Porém, quando o zoom está menor e vemos as coisas de longe (tanto no espaço como no tempo), a história é diferente, e as mesmas decisões individuais acabam muito mais conformando em torno de uma expectativa, dado o contexto em que foram feitas (novamente espaço-temporal). Quase que como se uma mão invisível, no final, fosse o que guiasse nossos destinos.


Fonte das Imagens na ordem com que aparecem:

- https://livewire.thewire.in/gender-and-sexuality/will-the-new-phrase-people-with-obesity-end-fat-shaming-not-likely/

- https://www.nature.com/news/the-tantalizing-links-between-gut-microbes-and-the-brain-1.18557

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