Brasil 2018, Uma Paródia da Eleição Presidencial Americana

A Eleição para Presidente nos EUA em 2016 não vai, provavelmente, entrar para a História como um belo exemplo de Democracia, mas isso não remove dela as valiosas lições que pode nos ensinar, e nada melhor para aprendê-las do que realizar uma paródia dela, acontecendo neste exato momento, no Brasil, e como dizem os comerciais de carros com "Pessoas de verdade, não Atores". A eleição nos EUA tem algumas peculiaridades que são raramente encontradas em outros países, uma delas é o colégio eleitoral que, independente de suas origens e justificativas, é basicamente um sistema onde cada Estado recebe um voto por cada representante que aquele Estado tem no Congresso Federal, e um voto para cada Senador, e mais como tradição do que como Lei, os Estados concedem todos os seus votos para o candidato que vencer as eleições naquele Estado. Isto é o que é apresentado nas centrais de notícias quando mostram um mapa com estados de cores vermelhas, azuis e cinza (Republicano, Democrata, Não finalizado). Existem apenas duas exceções, Maine e Nebraska, onde o Estado distribui seus votos proporcionalmente aos resultados da eleição no Estado. Além disso, mesmo permitindo mais de dois candidatos, existe um monopólio dos dois principais partidos, que possuem poderes de nações, e que elegem seus candidatos em uma série de Primárias. A eleição no Brasil é bem mais simples, muitos partidos estão aptos a concorrer e mesmo partidos com suporte popular mínimo conseguem lançar candidatos. As eleições se dão em dois turnos, um primeiro turno com todos os candidatos elegíveis, e um segundo com os dois melhores colocados caso ninguém tenha conseguido mais da metade dos votos válidos no primeiro turno.

O sistema eleitoral com múltiplos partidos não remove, porém, a divisão ideológica que abrange o debate, Esquerda-Direita, Liberal-Conservador, Socialista-Capitalista e assim por diante, divisão que tende ao binarismo, assim como as eleições nos EUA são de forma mais explícita. Em termos práticos, o primeiro turno é basicamente as Primárias, e assim como estas, tende a polarizar a população em campos ideológicos e esta vai escolher os candidatos desses campos para seguir adiante, sendo que existe baixa migração de eleitores em grupos ideológicos distintos. Pode acontecer dos dois candidatos ao segundo turno terem o mesmo perfil ideológico, situação menos incomum em eleições estaduais, como é o caso atualmente em São Paulo (dois candidatos conservadores indo pro segundo turno). O mesmo acontece nos EUA, Hillary não possui muito apoio na ala progressiva do partido Democrata, que tende a apoiar Elizabeth Warren ou Bernie Sanders, e a maioria prefere não votar à ter que votar na Hillary, mesmo sabendo que esta decisão pode custar caro. O fato é que campanhas entre Democratas conhecidos como Blue Dogs (eleitos em estados republicanos e portanto com uma pauta mais conservadora) e qualquer Republicano tende a orbitar a centro-direita e ignorar grande parte das demandas da esquerda, criando uma situação similar a um segundo turno entre dois candidatos de perfil ideológico similar. Resumindo, quero dizer que no dia 7 de Outubro, o Brasil irá realizar as Primárias, elegendo os dois candidatos que irão para as Eleições Gerais, ou como bem conhecemos o segundo turno. É importante mencionar que no Brasil o voto é obrigatório, e deve ser justificado em caso de ausência, o efeito disso é que existe um grande volume de votos inválidos no dia da eleição, onde o eleitor ou não escolhe ninguém (Voto Branco, menos racista em Português, ufa), ou anula seu voto escolhendo alguém que não está concorrendo (Voto Nulo). Votos inválidos tem o efeito prático de reduzir o número de votos totais, beneficiando assim o candidato que termina vencedor pois reduz o número de votos necessários para atingir uma dada proporção (O paralelo nos EUA é votar fora dos dois partidos). As eleições são realizadas em um único dia, o eleitor comparece ao local de votação e, uma vez autorizado, entra o número do seu candidato em uma Urna Eletrônica (para anular o voto entra-se um número inválido, e as máquinas costumam vir com números inválidos atribuídos à personalidades, mortas quase sempre, como escritores).

Ok, sem mais delongas, aqui está o elenco da nossa Paródia Tropical da Eleição Presidencial Americana.

Fernando Haddad, candidato pelo partido eleito nas últimas eleições (e que não é o partido no Governo), PT, pode ser chamado de Esquerda em muitos círculos, exceto na ala mais progressiva da própria Esquerda. Foi anteriormente prefeito de São Paulo, e Ministro da Educação, mas ainda assim não é muito conhecido no País, e aonde é conhecido não é muito popular, dado o recente histórico de Impeachment e escândalos de corrupção no partido, além de baixo desempenho entre seus constituintes na cidade de São Paulo (ele perdeu sua campanha para re-eleição). Fora da política, estudou Direito, Filosofia e Economia, e é, ou foi, professor e pequisador na Universidade de São Paulo. Tem poucas ideias originais para realizar mudanças concretas no País, que vêem desempenhando mal em vários indicadores globais e está extremamente endividado, além de possuir alianças dúbias e ideologicamente incoerentes com sua campanha. Sua vice-presidente é a ex-candidata Manuela D'avilla, que havia feito, durante sua candidatura, um conjunto de propostas de campanha que ainda não está certo se compõe a campanha de Haddad. Haddad e o PT tem grandes esperanças em angariar o eleitorado de Lula, mas mesmo que o candidato fosse o próprio Lula, esta campanha é extremamente difícil, dado o conjunto de eventos recentes e o atual clima político.



Haddad interpretará Hillary Clinton. Ela foi Secretária de Estado (algo como Ministro das Relações Exteriores) durante a administração Obama, é a candidata favorita da elite política, porém muitos no partido não se sentem representados por ela e não iriam votar para ela nas primárias e potencialmente não votaram quando ela foi escolhida pelo partido. Não apenas ela, mas o partido Democrata, é alvo de críticas a um baixo desempenho econômico geral, aumento da desigualdade social e dos impostos. Ela, pessoalmente, esteve envolvida em investigações sobre sua atuação e o partido teve um presidente deposto por Impeachment. Fora do poder executivo (nos EUA, alguns cargos no jurídico são por eleição, e portanto, políticos), ela tem formação em Direito, tendo iniciado sua carreira como Advogada e depois Procuradora (District Attorney). Sua campanha foi marcada por ser identitária, ou seja, focada fortemente em questões raciais, imigração, sexualidade e desigualdade de gênero, mas ela mesmo não tem um histórico forte de defesa destas questões. Durante sua campanha e seu período como Secretária de Estado, teve diversos vazamentos que danificaram sua imagem e a imagem do partido, incluindo os e-mails do John Podesta e várias evidências de que as Primárias foram influenciadas para favorecê-la.

Ciro Gomes, um homem com longa história política, começou a carreira cedo, em meados de seus vinte anos, como Deputado, mas rapidamente transitou para o poder executivo onde foi prefeito de Fortaleza e posteriormente Governador do Ceará. Teve vários sucessos em sua carreira o que se confirma no apoio que recebe de seus constituintes passados. Ainda na sua carreira pública, foi Ministro da Fazenda nos primórdios do Plano Real, e depois foi Ministro da Integração Nacional (o que é um título vago e, honestamente, não sei bem qual alçada). É formado em Direito e Advogado pela OAB, possui experiência também na área privada onde trabalhou como executivo, assim como é também professor universitário. Apresenta-se como o candiato mais preparado, com extensas explicações sobre os mais diversos tópicos e uma plataforma que promove direitos trabalhistas, melhoria na qualidade de vida e justiça social. Afirma que o "Baronato Rentista" (Capitalistas do mercado financeiro), principalmente os grandes Bancos e seu monopólio, estãopor trás de muitos dos problemas da nação, entre eles, desmantelamento da Indústria, Comodificação da Economia,  e favorecimento do Capital estrangeiro e da classe Capitalista em detrimento da população e do meio ambiente. Advoga por maior taxação dos ricos e grandes fortunas e uma revisão da Previdência Social e do Sistema Tributário, focando em simplificar o sistema reduzindo os impostos e reajustando as competências.



Ciro interpretará Bernie Sanders. É simplesmente lógico. Eles compartilham muitas das mesmas visões, e possuem quase as mesmas plataformas. Diferentemente de Bernie, Ciro começou mais cedo e adquiriu mais experiência no poder Executivo, mas fora isso, consigo apenas dizer que Ciro costuma se aprofundar mais nos detalhes em debates e entrevistas. Bernie começou sua carreira política como prefeito de Burlington no Estado de Vermont, aos 40 anos de idade, após sua gestão tornou-se Deputado Federal pelo Estado por vários anos e posteriormente Senador, cago que ocupa no momento (e tenta re-eleição). Ele não é Democrata apesar de ter ingressado no partido temporariamente para concorrer à candidatura. Ele é um ativista dos direitos trabalhistas e por menos intervencionismo na esfera internacional, advoga também pela universalização da Saúde e do Ensino Superior, assim como taxação de grandes fortunas e maior regulação do sistema Financeiro. Bernie entrou na campanha com um audacioso projeto de renovar o partido Democrata de dentro pra fora, desafiando a candidata da elite política do partido e atraindo forte base de apoio do eleitorado para causas Progressivas.

Guilherme Boulos é um novo nome no cenário político Brasileiro, tendo apenas obtido visibilidade no passado por seu envolvimento com o Movimento dos Sem Teto de São Paulo, organização que tem como uma de suas estratégias a ocupação de imóveis e propriedades abandonadas, além de diversos protestos. Ele vem de uma família de classe média, estudou Filosofia e tem mestrado em saúde mental, assunto este que leciona como professor. Como um nome novo, não possui cargos públicos anteriores, além de ser recém ingresso no seu partido, o PSOL. Boulos defende todas as posições da Esquerda, incluindo as apresentadas por Ciro e Haddad, provavelmente, levando as mesmas ainda mais para a Esquerda.



Boulos irá interpretar Jill Stein. Jill concorreu na última eleição como uma "terceira opção", ou seja, por um partido que não é um dos dois grandes, no caso o Partido Verde. Isso foi mal visto pela maioria do partido Democrata e seus eleitores, pois muitos dos que votam em Jill são potenciais eleitores Democratas e, portanto, são acusados de "indiretamente ceder as eleições aos Republicanos", como aconteceu em 2000, nas eleições entre Bush e Al Gore, onde o candidato do Partido Verde ganhou votos na Flórida que poderiam ter ido para Al Gore, mudando assim os resultados da Eleição. Jill também não possui prévia experiência no governo, nunca tendo ocupado cargo público, e possui em grande parte as mesmas pautas que Boulos, como maior abertura no processo democrático, promoção do bem estar social, melhoria no sistema educacional e teve no passado histórico de ativismo e envolvimento com protestos, incluindo o Occupy Wall Street.

Marina Silva, da Rede, é uma difícil de encontrar paralelo nos EUA, mas ainda assim possui um bom percentual do eleitorado e representa uma estranha combinação de posições e alianças. Ela tem um passado de luta e veio de família pobre, foi duas vezes Senadora pelo Acre, e Ministra do Meio Ambiente no Governo Lula, enquanto ainda era do PT, porém ao mesmo tempo possui alianças em grupos bem conservadores e a trágica perda de seu parceiro de campanha, Eduardo Campos, na última eleição, lançou-a diretamente nos grupos a que tinha se aliado, o que não só remodelou sua campanha mas seu partido com uma estranha combinação de pautas da Esquerda e da Direita.


Marina irá interpretar dois papéis nessa campanha, principalmente devido às suas posições localizadas em algum lugar ao centro do espectro político. Ela interpretará secundariamente Evan McMullin, um ex-agente da CIA que se apresentou como possibilidade na corrida, e angariou um bom eleitorado no Estado de Utah, de maioria Republicana e Mórmon, com números melhores do que Trump e Hillary no Estado, mas quase nenhuma presença fora dele. A principal personagem porém será John Kasich, Governador do Estado de Ohio e o que muitos denominam como Republicano moderado. Ele é favorável a legalização da maconha (assim como o Vice de Marina), e possui posições amigáveis no que tange o assunto meio ambiente, o que contrasta com demais Republicanos. Os papéis que ela interpreta já dão uma previsão do destino dela nestas eleições, ela não tem muito controle do eleitorado e caso não abandone a corrida antes do primeiro turno, provavelmente não terá muitos votos e buscará no segundo turno direcionar o remanescente do eleitorado, mas assim como as personagens que interpreta, muito provavelmente não fará muita diferença na corrida.



Henrique Meirelles é o atual Ministro da Fazenda e foi anteriormente Presidente do Banco Central, um homem rico e cujas posições são alinhadas as do Governo atual, do mesmo partido dele, o MDB. Ele interpretará Ben Carson, já que ambos são Conservadores em suas pautas e também tem o mesmo feitiço da lentidão lançado sobre ele. Ambos são reconhecidos em seus respectivos campos como excelentes profissionais, porém fora dele tendem a ter um desempenho baixo.



João Amoêdo, do NOVO, é outro novato na arena política, assim como seu partido, mas não compartilha o passado do outro novato, Boulos. Amoêdo é um homem rico, oriundo de uma família poderosa e influente que tem em seu passado um longo histórico de parcerias e presença na política. Ele é engenheiro mas sua atuação profissional é em grande maioria na área financeira, tendo ocupado altos cargos em alguns dos principais Bancos do País. Suas posições são conservadoras, e seus princípios econômicos são, em grande parte, extraídos da teoria Neoliberal, e portanto foca em redução do poder estatal, e diminuição da sua esfera de influência. Ele interpretará Carly Fiorina, empresária e ex-CEO da HP, sendo que ambos compartilham pautas conservadoras, não possuem experiência política e são candidatos com um forte conflito de interesses.


Álvaro Dias, um candidato que eu honestamente pouco conheço, apesar de ser ex Governador do Paraná, e de apresentar um bom desempenho no eleitorado do Sul do País. Apresenta-se como candidato conservador, e favorece em seu plano de governo pautas conservadoras e alinhadas com as do atual Governo. Ele interpretará Rick Perry, também ex-Governador (do Texas) e que também conheço muito pouco, além do mais ... bom, ambos são conservadores. Uma boa razão para o papel é que Rick foi alvo constante de chacotas e memes durante a candidatura, o que também acontece com Álvaro, além disso ambos tem grande preocupação na manutenção da boa aparência.

Geraldo Alckmin, Governador de São Paulo, e candidato pelo PSDB, um dos dois partidos centrais nesta disputa no Brasil (o outro sendo o PT). Alckmin se apresenta como um candidato de centro-direita, mas seu partido está no momento apoiando o Governo e tem em grande parte da sua história promovida pautas conservadoras mais do que outros partidos, especialmente dado sua influência política. Como ocorre com Fernando Haddad, seu partido é mencionado em diversos escândalos de corrupção, porém, diferentemente do PT, a maioria dos acusados não foi condenada, ou foram presos e depois libertos por ordem judicial. Alckmin também foi Governador durante diversas investigações sobre corrupção em empreendimentos do Governo, como expansão do Metrô e obras viárias. Como a maioria dos candidatos apoiando o governo atual, sua campanha traz pouquíssimas novidades para o país, focando-se em defender o candidato de acusações e de promover sua disciplina fiscal.



Alckmin será Jeb Bush, ambos são conservadores e tem forte associação com as políticas de seus partidos, sendo provavelmente, os candidatos que mais representam o status quo. Jeb é de uma família com grande prestígio político (bom, não pra mim, mas de qualquer forma são dois ex-presidentes) e não tem envolvimento pessoal passado em nenhum grande escândalo. Ambos, porém, compartilham de uma enorme falta de carisma. Chris Christie poderia ser uma opção aqui, mas acho ele muito caricato e Alckmin não se equadra no perfil. É importante observar também que Fernando Henrique Cardoso, FHC, Presidente de 94 a 2002 e Ministro da Fazenda durante a implantação do Plano Real, tem um forte e fiel eleitorado nas principais regiões do país, e opera como um padrinho para Alckmin. Mas mesmo assim o partido tem pouca inserção em importantes regiões do país, especialmente porque estas foram pouco desenvolvidas durante os governos FHC. Jeb Bush também representa a tradição de "passar o bastão", recebendo a "benção" política do líder anterior do clã, seu irmão George Bush.

Jair Bolsonaro, o último porém não menos importante (quem me dera), é atualmente Deputado Federal pelo Rio de Janeiro, em seu sexto ou sétimo mandato, porém com baixíssima atuação no Congresso, mesmo depois de seu longo período, e com forte tendência de se aliar com bancadas conservadoras em votações. Sua plataforma recente, porém, é que esta por trás dos bons resultados nas pesquisas. Ele faz uma campanha polêmica, com muitos dos elementos da extrema direita Americana, como racismo, homofobia, supremacia branca, militarismo, misogenia e assim por diante. Ao mesmo tempo, aproxima-se agressivamente da elite neoliberal, que mais representa a atual elite brasileira, com promessas de austeridade fiscal e privatizações de todas, se possível, as empresas estatais e recursos naturais. Ele faz esta aproximação com a Direita ao mesmo tempo que campanha sobre o patriotismo e a criação de um país forte, modelado na disciplina militar, e maior poder e uso das forças de segurança. Ele concentra seus ataques na Esquerda, que denomina Comunista, e afirma ser a principal culpada pelas mazelas do país, culpa esta que ele tende a direcionar principalmente à Lula e ao PT. Conseguiu um forte apoio nas comunidades Cristãs, incluindo algumas que tendem à Esquerda, mas o apoio é especialmente forte entre os Evangélicos, suporte este que se manifesta também por meio do apoio de candidatos Evangélicos com grande popularidade (como Marco Feliciano, candidato por São Paulo). Ele foi membro do Exército Brasileiro, atingindo o posto de Capitão, e tem como candidato à Vice Presidência um ex General.



Jair Bolsonaro interpretará Donald Trump, uma comparação difícil de não fazer, porém ele promove uma adaptação cultural enorme ao Trump, definitivamente o Oscar vai pra ele, é o melhor na construção do personagem e sua interpretação, foi capaz de ajustar a retórica cheia de ódio de Trump pra realidade tupiniquim, com seus altos índices de criminalidade e desigualdade social obscena, também faz um ótimo serviço em entender e aceitar o lema "America First". Por fim, é difícil levar em conta o tempo como parlamentar de Bolsonaro, considerando a baixa produção ele pode até ser considerado um novato na política. A cereja no bolo é que ele é mais do mesmo, assim como Trump é. As políticas do Trump e seus ministérios são o pântano que ele prometeu drenar, ele aliviou nos impostos de uma minoria enquanto cancelou diversos programas de assistência e demais investimentos sociais, e Jair Bolsonaro já tem as alianças para fazer exatamente o mesmo.

Tem outros candidatos, como Cabo Daciolo e Eymael (que ninguém sabe se é nome ou sobrenome, mas provavelmente ninguém nem se importa), e poderíamos tentar enquadrá-los nas vagas do elenco, como Chris Christie e, até melhor, Marco Rubio e Ted Cruz, mas nenhum dos candidatos remanescentes faria um bom trabalho nestas posições, e se for pensar, nenhum dos outros Republicanos foi muito relevante nas primárias, Trump liderou desde o princípio em quase todos os Estados. Eles esticaram a estada nas primárias mais porque demoraram para aceitar o que todo mundo já sabia.

Todos sabemos o que aconteceu nas eleições Americanas, mas ainda é muito cedo para decidir vencedores e perdedores, exceto que a mídia está fazendo exatamente isso. Não é que falta a febre da mídia em nosso paraíso tropical, é um pouco menos barulhenta, mas ao mesmo tempo tem menos vozes alternativas, então no geral, temos o mesmo balanço ideológico mas com menos volume, provavelmente porque gastamos bem mais tempo na produção de memes e tudo que tem de maluquice disponível (a galera fazendo flash mob com dança pra candidato, na mesma linha das coreografias do impeachment). A mídia fez um excelente trabalho colocando o holofote no Bolsonaro, assim como nos EUA, onde o candidato não tinha a estrutura política de apoio e canais de divulgação, mas com a cobertura constante de seus devaneios públicos, ele foi colocado no centro do palco, e como por detrás de alguns olhos não existe massa cinzenta, a exposição apenas foi o suficiente para lançar o candidato ao topo das pesquisas. Como diz o ditado, "falem mal, mas falem de mim".

A Direita, neste momento, orbita Bolsonaro, que lidera os outros candidatos em preferência do eleitorado de centro-direita e direita. Novamente, nenhuma mudança com relação as eleições Americanas, onde Trump liderou desde o princípio nas primárias Republicanas. A retórica "anti-establishment" tem um papel importante, especialmente para angariar votos dos mais jovens e menos informados, assim como muitos dos desassistidos e saudosistas. É curioso o funcionamento da retórica, frente ao fato de que ele representa o "establishment", tendo estado no Congresso por quase 30 anos e votando em linha com as posições dessa elite. Os outros candidatos, exceto Amoêdo, são todos penalizados pela bagagem política, não são considerados de confiança pelos eleitores associados ao "anti-establishment". Amoêdo não apresenta bons resultados nas pesquisas, provavelmente porque carece de uma campanha agressiva e do carisma do Bolsonaro, mesmo eles defendendo praticamente as mesmas políticas, também é mais moderado ao se posicionar sobre temas sensíveis como armas, aborto, drogas e não aparenta contar com apoio de grupos religiosos.

A Esquerda enfrenta a mesma exata situação dos EUA, então esta parte da paródia está desenrolando perfeitamente (mas não felizmente). Marina ainda conta com alguns votos da esquerda, mas como mencionei ela não tem um posicionamento firme em pautas importantes e segue perdendo eleitorado para outros candidatos, sobrando assim uma parte do eleitorado de comunidades religiosas (como McMullin) e uma parte de conservadores moderados (como Kasich). Boulos definitivamente será a Jill Stein na disputa, não possui chance alguma de ganhar, mas visto que nenhum outro candidato representa seu eleitorado, ele quer ser a voz dessa população. Seu eleitorado é um dos mais difíceis de votar Ciro ou Haddad, e pode ser a diferença entre qual deles irá para o segundo turno, se é que algum deles vai (lembrando que pode ocorrer de dois candidatos conservadores irem para o segundo turno). Por fim, temos o palco central com Ciro e Haddad, Bernie vs Hillary, com muitos dos mesmos paralelos. Haddad irá utilizar todo o peso de sua máquina partidária, com boa exposição de TV e rádio, exposição na mídia e a popularidade de Lula em algumas regiões do país, enquanto Ciro está angariando seu suporte da base, no comício, na passeata, na Internet, nos debates e entrevistas, buscando ao máximo espalhar sua mensagem e projetos de mudança. Podemos notar também que a campanha de Haddad começa a utilizar de propostas apresentadas por Ciro, buscando angariar alguma parte do eleitorado dele no primeiro turno e uma aceitação maior da esquerda caso avance para o segundo turno.

O segundo turno pode ser bem trágico para Haddad, principalmente por sua rejeição dentro de parte da Esquerda, e mesmo que ele se eleja, terá que lidar com um Congresso provavelmente desfavorável e já tem diversas alianças formadas que exigirão retornos uma vez ele eleito. O maior obstáculo para Ciro nesse momento é Haddad, e não devido as diferenças ideológicas, mas porque o eleitorado do Haddad está encantado na fantasia do Novo Lula, e não na realidade da Outra Dilma. Para complicar, Ciro escolheu como sua vice na chapa, Kátia Abreu, ex Senadora por Tocantins e associada ao Agronegócio, ela é alvo de críticas de grupos ambientalistas, sindicatos e direitos indígenas, chegando a opor legislação para maior fiscalização e proteção contra escravidão moderna (que é a velha escravidão, com novidades). Esta escolha, mesmo boa para setores mais ao centro, como os setores produtivos de extrema importancia para a economia, é terrível para eleitores mais conscientes das pautas ambientais e de proteção de povos nativos, que vêem nesta escolha um retrocesso na agenda ambiental brasileira. O anúncio vem em má hora também, quando enfrentamos a dura realidade das mudanças climáticas, signatários de vários tratados e acordos de redução e controle de emissões, e estando ao centro do debate na prevenção de um colapso (agronegócio tem grande peso, assim como a extração de petróleo, o desmatamento e os incêndios florestais). Ciro não trouxe a público nenhum projeto, programa ou material de campanha que tenha como prioridade a proteção e restauração do meio ambiente, assim como não traz nenhum que acelere sua destruição.

Quem sabe o que acontecerá a seguir, mas se nossas "Pessoas de verdade, não Atores" seguirem o roteiro deles, nós podemos ao menos nos preparar para o que vier, o que no caso deste Remake será ainda mais trágico, visto a tendência do brasileiro ao drama. Mas o Brasil nunca desaponta em surpreender, e talvez vejamos nessa eleição as concessões que não tivemos no episódio passado ... que nada, podemos até ter golpe militar  no caso do nosso Trump tropical não ganhar, visto que ele (em um golpe de mestre) na cama do hospital está lançando suspeitas sobre a segurança da urna eletrônica e que Haddad estaria armando para trapacear nas eleições. O resto do povo está seguindo o roteiro também, com ondas de ataques e hacks nas redes sociais e a polarização tóxica da população que cada vez mais odeia a oposição. Estava quase me esquecendo de mencionar os gritos de "Lock Her Up" (Prenda Ela), que em sua versão tropical ficaram de ponta-cabeça e se tornaram um "Set Him Free" (Liberte-o), no nosso caso o grito é "Lula Livre".

É isso aí ... fica ligado aí que tem mais capítulos nessa novela.

Comentários